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Experiência

Terra de despedidas

Ser imigrante é viver entre a alegria de fazer novas amizades e a dor de ter que dar adeus. Quantas vezes você já deixou um amigo no aeroporto, quantos abraços apertados já deu e quantos “boa viagem” já desejou?  

Quando comecei a escrever esta matéria estava a caminho de um restaurante japonês, onde me despedi de uma amiga que voltou ao Brasil depois de uns dois anos morando aqui. Trabalhamos juntas durante todos os finais de semana nos últimos sete meses.

Posso dizer que 70% dos meus amigos aqui são brasileiros, mas a amizade não se justifica simplesmente pelo fato de falarmos a mesma língua ou de termos nascido no mesmo país. Sou amiga das pessoas de quem eu seria amiga naturalmente, mesmo se estivesse no Brasil. Não saio na rua perguntando se a pessoa é brasileira para só então poder ser minha amiga, digamos que elas simplesmente aparecem. Talvez  pela semelhança de culturas, mas não só isso, já que a experiência de vida de um paulista é completamente diferente da minha de recifense, por exemplo.

Uma vez estava numa roda com dois paulistanos, um paulista e uma francesa que falava português muito bem. De repente notei que ela estava perdida na conversa, já que os rapazes riam e acrescentavam palavras em cima da história do outro, e percebi que a francesa não estava entendendo nada, e não por desconhecer o idioma, mas pela falta de um passado em comum com eles. Eu, que sou 100% brasileira, também não estava entendendo muito a conversa deles.

É mais ou menos assim que me sinto nas conversas daqui, entre canadenses: não é pelo fato de não falar inglês, pois domino o idioma, mas pelo fato de não ter vivido o que eles viveram, de não saber nomes de ruas e lugares, de brinquedos da época de criança, de programas de TV que marcaram a vida deles, das piadas, enfim… talvez isso explique um pouco o fato de, naturalmente, eu acabar me aproximando mais de brasileiros.

Quando estudei cinema aqui em Toronto, sentia que não “pegava” as conversas em inglês, e que isso não acontecia só comigo, pois a mexicana que estudava conosco também não acompanhava o papo e nem os colombianos. Lógico que para um brasileiro é mais fácil entender a conversa de um brasileiro. Só não entendi o papo dos meus três queridos amigos de São Paulo porque eles estavam sendo muito específicos, falando de lanchonetes e lugares que eu não conhecia porque sou de outro estado.

Aliás, eu nunca tinha convivido tanto com pessoas de São Paulo como neste ano que passou e confesso que achei todos maravilhosos, como também são os cariocas, cearenses, baianos, paranaenses. O que quero dizer é que a nacionalidade das pessoas não determina o sucesso de uma amizade. Pessoas de toda parte do mundo podem se tornar amigas, só basta que as ideias e pontos de interesses sejam parecidos. Havendo identificação, geralmente há amizade.

O único ponto ruim de ter amigos brasileiros aqui no Canadá é que muitos acabam indo embora. Há três anos, quando tive que me despedir de um grande amigo, pensei: a partir de hoje, quando conhecer alguém, vou logo perguntar o status, se tiver visto de turista ou de estudante, prefiro nem me aproximar.

Mas é claro que na prática não é tão simples assim, e ainda bem, senão eu não teria conhecido tantas pessoas maravilhosas que passaram pela minha vida.

Mas é isso, viver no Canadá nos deixa assim: alegres por estarmos sempre conhecendo pessoas novas, mas ao mesmo tempo tristes porque também sempre temos que dar adeus.

Hoje mesmo outro amigo me disse que terá que voltar ao Brasil caso não consiga renovar o visto. Já estou aqui sofrendo de saudade por antecipação. Na vida são raras as pessoas de quem gostamos e com quem temos afinidade de verdade. Em Recife deixei algumas delas, e com o passar do tempo me despedi de algumas outras, amigos de diversas nacionalidades: americanos, suecos, noruegueses, alemães, australianos, canadenses e, claro, brasileiros de vários estados.

O consolo é saber que a vida continua e as boas lembranças estarão sempre presentes. Assim será com a amiga de quem me despedi recentemente no restaurante japonês e com todos aqueles de quem ainda terei que me despedir.

E você, já teve que dizer adeus muitas vezes desde que chegou a Toronto?

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Martha se formou em Jornalismo em Recife e veio para Toronto em 2006 para estudar Cinema, se formando pela Toronto Film School. Tornou-se cidadã canadense em 2014.

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