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Experiência

O luxo do lixo

Aprendi que a parte mais difícil da adaptação a um novo país está nos detalhes mais simples. Quando planejava a mudança, várias coisas me preocupavam, como casa, transporte, salário, etc. Mas nunca me dei conta de que os pequenas ações do cotidiano canadense me pegariam desprevenido como fizeram.

Em uma conversa descontraída com uma conhecida, também imigrante, ouvi-la dizer que “é como se nos tornássemos crianças outra vez e tivéssemos que aprender tudo novamente”.

Por exemplo, a coleta de lixo, algo tão simples e banal que nunca havia sequer considerado como um processo, aqui é tão diferente que requer um “manual de instruções”. Não que seja complexo, mas como toda cidade (ou região) faz sua coleta seletiva, existem compartimentos e datas específicas para que a prefeitura faça a retirada do lixo.

Diferente do Brasil, a coleta de lixo nos bairros é feita apenas uma vez por semana e alguns tipos de lixo somente são coletados uma vez ao mês e podem ter coleta suspensa durante todo o inverno.

O primeiro detalhe a me surpreender foi a existência de vários compartimentos. O green bin (balde verde), a blue box (caixa azul), o garbage bin (latão de lixo), yardwaste bag (sacola para detritos de jardim), entre outros.

No green bin, são colocados apenas os resíduos orgânicos, como restos de comida, cascas de frutas e ovos, entre outros materiais permitidos para a produção de compostagem. Esses resíduos, normalmente da cozinha da casa, são reprocessados pelos centros de reciclagem para a produção de compostos orgânicos e adubo, que por sua vez serão revendidos para o mercado para serem utilizados no jardim e na produção agrícola.

Na blue box, apenas os materiais recicláveis como caixas de papelão, garrafas PET, potes de margarina e maionese, etc. Cada municipalidade tem sua planta de reciclagem e sua abrangência de materiais. É necessário verificar no programa quais são os materiais considerados recicláveis na sua região.

É considerado garbage (lixo) tudo aquilo que não pode ser reciclado e, efetivamente, apenas cerca de 30% do lixo domiciliar não pode ser reciclado de alguma maneira. Em Mississauga, pertencente à região de Peel, há um limite de uma lata mais uma sacola de lixo por domicílio, qualquer coisa além disso não é coletada pelo lixeiro naquela semana.

Outros tipos de “lixo” como o yardwaste (ou resíduos de jardim), folhas e galhos de árvore, móveis, botijões de gás (usados em churrasqueiras) são considerados resíduos especiais e têm datas específicas de coleta. Alguns (como os móveis grandes, tipo um sofá) devem ter suas coletas agendadas na prefeitura. Basta fazer uma ligação e solicitar o serviço.

É tudo muito óbvio uma vez que se entende o sistema, mas na prática pode se provar um desafio. Eu levei duas semanas para entender por que o bendito lixeiro não coletava meu lixo.

Um dos motivos pelos quais eu amo este país é a organização e suporte oferecidos pelo governo, e no caso do lixo não é diferente. Para descobrir como tudo funciona basta acessar o site da prefeitura e consultar o Waste Wizard (no caso de Toronto). E todo o lucro obtido pela venda dos materiais reciclados pela prefeitura é revertido em investimentos em infraestrutura, como manutenção das vias públicas, melhorias de hospitais, projetos sociais (que podem também ser conferidos no site) e na produção e distribuição dos calendários de coleta que são entregues nas residências duas vezes ao ano.

Um último detalhe interessante é que o “lixo” canadense já foi considerado o mais rico do mundo. E vivendo aqui fica fácil entender o porquê. É bem comum nos dias de coleta, encontrar móveis “novos” esperando para serem levados pelo lixeiro. E uma das tradições entre os imigrantes recém chegados é, claro, se aproveitar dessa peças para mobilhar a casa. O que um amigo colombiano chama de “the immigrants way” ou o jeitinho do imigrante. E, de fato, todo imigrante que eu conheço tem alguma peça de mobilha em casa achada no “lixo”. Dando um sentido todo único ao ditado “o lixo de uns é o tesouro de outros”.

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Mauricio é paulista, natural de Guaratinguetá, formado em Marketing pela ESPM de Sao Paulo com especialização em Coordenação de Eventos Corporativos. Com mais de 10 anos de experiencia em produção de eventos no Brasil, se mudou para o Canadá no final de 2013 e atualmente reside em Mississauga, na GTA, e está se adaptando à vida canadense.

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