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Uma conversa sobre tatuagem

Este post devia falar sobre um leilão de obras de arte que acontece hoje, mas a pauta mudou quando conheci Marcella Rangel, paulistana, tatuadora profissional e mestre das tatuagens personalizadas.

Recebi uma sugestão de pauta sobre um leilão em prol dos desabrigados do terremoto no Japão. Alguns tatuadores se reuniram e doaram mais de 30 obras, quadros com pinturas em estilo de tatuagem. A tatuadora Marcella Rangel foi quem me mandou a sugestão e, no e-mail, ela ainda completava: “Eu como tatuadora/artista e amiga de vários japoneses, fiz a minha parte em nome dos brasileiros aqui de Toronto!”

Então marquei uma entrevista com ela em uma cafeteria. Não a conhecia, mas acreditei ser fácil reconhecê-la. Cheguei ao local com 10 minutos de atraso e fui logo procurando alguma mulher tatuada, e lá estava ela sentada em uma mesa no canto da cafeteria. Uma jovem loura, com piercings na boca, nariz, queixo, orelha e com um dos braços todo tatuado com desenhos de pincéis, flores, borboletas, morangos e abelhas. Falei com ela rapidamente e fui comprar um chá, foi quando a atendente me falou que era uma pena eu ter chegado, porque ela estava prestes a falar com Marcella sobre uma possível tatuagem que ela estava sonhando em fazer, e eu atrapalhei o momento. E assim começou a minha divertida conversa com Marcella Rangel, tatuadora profissional há mais de seis anos.

Ela é paulistana e voltou para Toronto há um ano, onde mora atualmente. É que Marcella fez high school aqui mas, cansada do frio, voltou para São Paulo assim que concluiu os estudos. Fez faculdade de moda por lá, mas sempre soube que sua paixão era mesmo fazer arte na pele das pessoas. Desde pequena sonhava em fazer 18 anos para poder fazer uma tatuagem. Sempre quis ser tatuadora, mas enfrentava a resistência dos pais, que não queriam que ela seguisse essa profissão. Tentando achar o que fazer da vida, foi buscando arte em outras áreas. Aos poucos, foi tatuando os amigos em casa mesmo, depois os amigos dos amigos, e aí não parou mais.

Os irmãos sempre foram seus aliados e verdadeiros “cobaias”. “Assim que comecei a tatuar e tinha umas ideias, falava para Arthur, o meu irmão mais velho, e ele levantava a blusa e falava, ‘então faz aqui’. Hoje ele é todo tatuado, mas cheio de tatuagens inacabadas, já que depois que eu traço as linhas, ele fica super empolgado, e quando volta para finalizar o desenho, ou já quer outra tattoo, ou eu já tenho outra ideia”, comenta Marcella a gargalhadas.

Personalizada

Normalmente o processo para fazer uma tatuagem é divido em etapas. Como Marcella não trabalha com desenhos pré-definidos (aquelas tatuagens prontas que ficam coladas na parede do estúdio ou em pastas), primeiro ela conversa com o a pessoa sobre a ideia da tatuagem desejada. O cliente então paga C$100 como garantia que vai fazer a tatuagem, e depois disso ela começa a criar, desenhar. “Muita gente traz pedaços de tatuagens como base, e daí eu penso como fazer o desenho no estilo da pessoa. É como uma entrevista mesmo, preciso conversar para entender o que a pessoa quer e depois passo horas desenhando. O legal é que eu descubro coisas que nem mesmo a pessoa sabia que gostava e quando eu mostro o desenho, ela fala, ‘nossa, era isso mesmo que eu queria’, conta.

Mas se por acaso você não gostar do desenho, não faz mal, ela amassa o papel e faz outro(s) até o cliente ficar satisfeito. Quando o cliente aprova o desenho, o estúdio em que ela trabalha desconta os C$100 (que já haviam sido pagos) do valor a ser pago pela tatuagem.

Passo a passo

Depois que o cliente escolhe o desenho, ele marca um dia para a sessão de tatuagem, que começa quando Marcella traça as linhas do desenho na parte do corpo escolhida. Dependendo do tamanho e dos detalhes, a sombra e a pintura, por exemplo, podem ficar para outro dia, já que ela passa no máximo quatro horas tatuando, para que nem o cliente e nem ela fiquem cansados.

O valor da tatuagem é cobrado por hora de trabalho, que custa C$130. “O diferencial é que estamos criando, fazendo uma tatuagem exclusiva, com a cara e a personalidade da pessoa, nada estilo anos 90, quando a pessoa olhava na parede ou em um catálogo e escolhia só os desenhos que estavam ali já prontos” comenta ela. O desenho não é cobrado e as horas começam a contar apenas quando ela começa a tatuar.

Preconceito

Marcella acredita que em Toronto há menos “olhares feios” para uma pessoa tatuada do que no Brasil. Aqui, as pessoas até olham para as tatuagens dela, mas muitas vezes com um olhar de curiosidade e não de reprovação. “No Brasil as pessoas achavam bem esquisito, é como diz minha vó, ‘uma menina tão bonita com esses rabiscos no corpo'”, brinca ela. “No Brasil a maioria é ‘inha’, florzinha, estrelinha, borboletinha. Aqui não, as pessoas querem tatuar o braço inteiro de borboletas, as costas de flores. Acredito que isso ocorre porque aqui as pessoas não têm medo de perder o emprego por conta de tatuagens, como acontece no Brasil”, explica.

Mito

Se você é fã de tatuagens, já deve ter ouvido falar que elas só podem ser feitas em número ímpar. Quando eu perguntei sobre isso à Marcella, ela disse não saber nem por que e nem como esse mito começou, mas que não acredita nele, já que ela própria já perdeu as contas e não tem ideia de quantas tatuagens tem pelo corpo. O que eu encontrei sobre a lenda é que a origem deve-se a um naufrágio de um navio-pirata e que só os piratas com os números ímpares de tatuagem sobreviveram, o que fez com que o fato de ter tatuagem em número par fosse associado a má sorte.

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Martha se formou em Jornalismo em Recife e veio para Toronto em 2006 para estudar Cinema, se formando pela Toronto Film School. Tornou-se cidadã canadense em 2014.

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