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Experiência

Profissão: Cleaner

[CAMILA TEIXEIRA CAPEL] Sou professora de português no Brasil, porém sei o quanto o inglês é importante para qualquer profissão. Assim, decidi me dedicar a estudar inglês em Toronto. Comprei o programa de três meses de estudo e três meses de trabalho. Quando todas as pessoas me diziam que três meses iriam passar como num piscar de olhos, eu jamais acreditei.

No entanto, dois meses voaram e o desespero de ficar sem dinheiro começou a aparecer. Tive que buscar coragem dentro do meu inglês, antes instrumental, para poder procurar emprego.

Primeiramente, perguntei aos meus roommates brasileiros quais seriam os passos para arrumar um trabalho em Toronto, e eles me disseram para decidir em qual área eu queria trabalhar. Eu realmente não sabia o que fazer e nem tinha ideia de onde poderia trabalhar- lembrando sempre que já vim consciente de que iria encarar qualquer desafio ou frustração.

Logo de início tentei buscar um trabalho em um restaurante ou lanchonete, porém refleti que se por acaso eu conseguisse, iria ser escrava desse trabalho até o meu retorno ao Brasil, que será ao fim deste ano. E eu não conseguiria deixar o trabalho facilmente caso estivesse ganhando bem. Por isso, como me conheço bem, resolvi nem tentar com muito entusiasmo.

Então, meus roommates– e agora amigos- disseram que seria bom eu ligar para algumas companhias de limpeza. Eles não tinham os contatos nem sabiam se eu teria que fazer a entrevista em inglês ou português. Demorei em torno de quatro dias somente para pesquisar algumas empresas e juntar a coragem para ligar, e mais uns três dias para realmente ligar. Eu não queria assumir o risco de ligar para alguém e começar a conversar como uma criança semianalfabeta.

Mas, antes de fazer essas ligações, eu precisei ir ao City Hall (a Prefeitura de Toronto) fazer o meu SIN Card (um documento com as mesmas funções do CPF). Lembram-se do Popeye? O personagem precisava comer espinafre, e eu somente precisava de um sorvete! Comprei-o na primeira estação de metrô em que parei e, munida de todas as minhas forças, fui fazer o cartão.

Quando cheguei ao City Hall pedi algumas informações e perguntei quais eram os documentos necessários. Logicamente, eu já tinha ido com todos os meus documentos em uma pasta para não perder viajem. Acredito, hoje, que este tenha sido o cartão mais fácil de fazer. Apenas precisei escrever todos os meus dados em uma folha e aguardar alguns minutos. Logo que saí, já com o número deste cartão em minhas mãos, senti-me tão poderosa que pensei: vou aproveitar e ligar para estes números agora!

Liguei para todos os números e somente com uma pessoa tive que conversar em inglês, pois em todos os outros locais havia brasileiros trabalhando. E surpreendentemente consegui um “bico” no dia seguinte. Por muito tempo escutei as pessoas dizendo que a limpeza em outros países não era tão pesada como a limpeza no Brasil, porém me deparei com um apartamento com a banheira preta de sujeira. Sim, a banheira tinha uma camada com uma coloração que ia de esverdeada à preta. Imaginem a minha felicidade.

Trabalhei o tempo todo pensando em como as pessoas podem deixar suas casas ficarem neste estado e simplesmente não limparem nada. As minhas primeiras sensações foram de raiva, nojo e depois de felicidade, quando recebi o dinheiro. Cheguei em casa acabada e moída. E este era apenas o meu primeiro dia.

Imaginei que meus outros trabalhos seriam mais tranquilos, todavia trabalhei quase dois meses neste ritmo frenético das faxinas. Trabalhei às sextas-feiras à noite, aos sábados dias inteiros e domingos ensolarados. Eu já não aguentava mais trabalhar assim, e quando pensei em desistir, consegui outro trabalho em um prédio para cobrir as férias de uma amiga.

Quando fui com a minha amiga conhecer o trabalho, uma “espécie” de treinamento, pensei estar sonhando, porque não havia nenhuma banheira preta, nenhum pó de construção ou geladeiras azedas; desta vez eu iria trabalhar na limpeza de um prédio e não mais limpando apartamentos. Quase não acreditei que eu iria trabalhar neste prédio por um mês ou mais.

Os meus colegas de trabalho eram portugueses e somente eu e a minha amiga, que hoje já voltou das férias, falávamos inglês. Se eu quase morri para falar ao telefone, imaginem ouvir qualquer coisa em inglês em rádios de comunicação. O primeiro dia que me chamaram no rádio só não usei o meu pó de pirlimpimpim porque o esqueci no Brasil. Respirei fundo e respondi à chamada no rádio. “Pronto, venci mais uma etapa,” pensei eu.

Com o passar dos dias me senti mais confortável em ouvir as pessoas falando no rádio e eu até queria usá-lo mais. Os dias foram passando e a convivência com um colega de trabalho foi se tornando mais amigável e suave. Um dia resolvi perguntá-lo por qual razão ele trabalhava como cleaner. Espantosamente, ele me disse que morava em Toronto há onze anos e, acreditem, ele não fala inglês.

Descobri que ele jamais frequentou um curso de inglês aqui e sequer se formou em Portugal. O trabalho que para mim é temporário, em todos os sentidos, para ele é sagrado. Sendo assim, ele trabalha com muito prazer e gosta muito de ser cleaner. Questionei-me como alguém pode gostar de trabalhar tantos anos fazendo a mesma coisa, ganhando o mesmo salário e sem perspectivas de crescimento. E cheguei a uma conclusão óbvia e simples: nem todos almejam carreiras ou planos de carreira surpreendentes.

A Profissão Cleaner tem me ensinado o que não aprendi em nenhuma das minhas duas faculdades. Coisas como: respeito mútuo, trabalhar com as diferenças de cultura, ultrapassar meus medos e vencer as minhas próprias frustrações. E agora nem ligo ou me apavoro quando o meu telefone toca ou quando tenho que responder à alguma pergunta na rua, em inglês.

O trabalho me possibilitou adquirir uma prática e uma vivência diferente da sala de aula. Tive oportunidade de aprender um vocabulário que até então jamais pensei que existisse. Acredito que o programa escolhido, de estudo e trabalho, tenha me ajudado bastante a desenvolver e praticar o idioma. No meu caso, particularmente falando, me senti muito mais segura com o inglês depois que comecei a trabalhar.

Então, se você esta pensando em vir para Toronto e quer trabalhar como cleaner, saiba que nem todas as faxinas são menos pesadas que as nossas do Brasil ou não imagine que você vai trabalhar pouco e ganhar muito. Venha consciente de que você pode encontrar qualquer tipo de trabalho e todas as dificuldades ou facilidades. Em quase todas as consideradas boas faxinas há um brasileiro, porque a nossa cultura é muito detalhista e minuciosa com limpeza.

O salário de um cleaner aqui gira em torno de $10,25 à 20 por hora.

Meninas, se vocês pretendem trabalhar em companhias limpando prédios, não irão encontrar um trabalho muito árduo. Porém, se vocês quiserem ganhar um pouco mais, podem tentar trabalhar limpando casas e apartamentos, procurando trabalhos particulares, como as faxineiras fazem no Brasil.

Meninos, caso vocês queiram trabalhar como cleaner, também podem, mas vocês provavelmente terão outras tarefas, como passar o mop (um tipo de esfregão), aspirador de pó e talvez trabalhar com a limpeza das latas de lixo. Cada emprego possui suas próprias funções, então, pode ser que vocês trabalhem menos ou mais.

Para quem está pensando em vir e trabalhar na limpeza, as minhas dicas são: motivação e força de vontade. Além disso, você precisa ser ágil, detalhista, comprometido, e topar enfrentar qualquer desafio. Gosto de lembrar que o humor é sempre bem-vindo e faz total diferença. Com um sorriso no rosto eu enfrento qualquer desafio.

Até breve.

foto: inf3ktion

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