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Onde estão os guardas? Isto não é normal.

Da primeira vez em que fui a um banco em Toronto, ao TD Bank da University Av. com Dundas St., não me dei conta do fato. Mais de um ano depois, quando voltei lá, é que comecei a reparar que não havia guardas, ou pelo menos não parecia haver. Aquilo não era normal.

Recentemente, quando eu retornei ao TD Bank, enquanto tomava um chá-de-cadeira servido pela gerente, é que constatei que não havia um único segurança na agência. Havia um “tiozionho” de bigode e jaleco amarelo, que orientava os clientes, mas nada de segurança. E mais, não havia guarita nem guarda armado em nenhum lugar visível. Enfim, não havia nenhuma das parafernálias de segurança a que estamos habituados em nosso dia-a-dia, nos variados estabelecimentos comerciais do Brasil, em especial nos bancos brasileiros.

Eu fiquei, como tantas outras vezes desde que cheguei ao Canadá, com os sentimentos divididos entre a alegria e a tristeza. Alegre por poder circular livremente com meus pertences, valiosos ou não, por ruas e lugares mais ou menos conhecidos, durante o dia ou à noite, e até mesmo ir ao banco e não encontrar guardas com revólveres ou metralhadoras. Alegre pela sensação de segurança e bem estar que Toronto propicia a todos que aqui vivem ou por ela passam. E triste pelo meu Brasil.

De pronto, acometeu-me o viés de economista e administrador e pensei no Custo Brasil: mais uma explicação para a diferença do “spread” bancário – o custo de segurança das agências e dos postos de serviço bancários no Brasil e nos países ricos. Depois eu adicionei aos guardas os custos associados às medidas adicionais de infraestrutura, tais como as câmeras de segurança; guaritas blindadas; portas giratórias com detectores de metal; alarmes especiais; monitoramento externo; seguros diversos; etc. Enfim, vários fatores a explicar o porquê da taxa de juros ao consumidor não cair no Brasil!

E por fim, lembrei-me da nossa tragédia social: quantas pessoas já morreram em assaltos a banco no Brasil? Recordo-me vivamente do assalto a uma agência bancária em Moema há alguns anos, no qual uma jovem fora baleada do outro lado da rua – a estudante estava a esperar o ônibus para ir para casa, mas terminou paraplégica; e a partir de então teve sua vida transformada em cobertura midiática, com roteiro escrito por Dante. Tragédia humana para vender jornal e anúncio de televisão. Triste. Muito triste.

Outro dia, sem mais nem menos e sem pedir licença, parou um caminhão, um carro-forte na minha rua. Eu estava saindo do centro comercial localizado na esquina da College St. com a Bay St., descendo a Bay St. sentido sul, quando ao meu lado para o blindado.

Pois é minha gente, gato escaldado e treinado em terras brasileiras, eu não dei sopa para o azar. Dei um salto de banda, e pus-me a andar rapidamente em direção ao pequeno parque, que fica atrás do College Centre. Eu só parei quando estava seguro e longe do carro-forte. Virei-me para o blindado e uma cena insólita se materializou diante de mim.

Abre a porta do blindado um segurança, sem portar arma alguma. Ele olha para a direita, olha para a esquerda, e desce do caminhão levando um pacote, que pela forma, peso e características só poderia conter dinheiro. Ele fecha a porta atrás de si, e caminha até o centro comercial da Bay & College. Entra no banco, faz o que tinha que fazer, e retorna com o pacote vazio nas mãos. A porta é novamente aberta. Ele entra e o carro-forte parte. Isto não é normal.

E eu ali, morrendo de medo à espera do tiroteio iminente. Eu só havia me esquecido que não estava no Brasil, mas em Toronto. E o guarda que nem arma tinha, como é que poderia haver tiroteio? O Caetano nos ensinou em Sampa: a mente apavora o que ainda não é mesmo velho. Pois é Caetano, um dia eu chego lá.

A gente tem que se acostumar com estas normalidades deste Canadá tão civilizado: a não-violência urbana; o não-assalto a banco; o não-assalto a carro-forte; e a não-vítima de bala perdida em tiroteio. Minha mente continua apavorada com esta novidade que Toronto oferece: não há guardas armados nas ruas ou nos bancos ou nos carros-fortes.

E a maior novidade e a mais apavorante de todas: eu não serei vítima de uma bala perdida em um assalto a banco ou a carro-forte; e nem de uma bala perdida saída de um tiroteio nas praias de Toronto Islands.

Eu preciso que esta sensação de segurança se torne velha conhecida e companheira, para que eu não me apavore mais diante de um carro-forte. Mas por enquanto, em verdade vos digo, isto está muito longe de ficar mesmo velho para mim.

Isto não é normal. Onde estão os guardas, mesmo?

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Economista e Admistrador, reside em Toronto há dois anos.

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