Saúde
Para os imigrantes, a barreira da linguagem é uma barreira à saúde
Sarah Bowen já passou muito tempo pensando sobre a comunicação em saúde, e ela gosta de resumir assim: “Há um ditado que diz que sem a linguagem, a medicina é a ciência veterinária”.
Converse com qualquer médico, enfermeiro ou assistente de imigração sobre a saúde dos imigrantes e eles vão tocar logo no assunto: frequentemente encontram pacientes que não falam a sua língua, muitas vezes é bem difícil se comunicar e os métodos para estabelecer uma conexão não funcionam.
E a linguagem continua sendo um problema persistente na saúde dos imigrantes, sem abordagens consistentes para guiar os profissionais que lutam para se comunicar com seus pacientes.
“Nós encontramos este problema sempre”, diz o Dr. Joel Ray, obstetra em Toronto. “Esses cenários estão se tornando muito comuns. Tornou-se evidente que não estamos fazendo a coisa certa quando não conseguimos obter o consentimento na linguagem correta, ou estamos fazendo de meia-boca através de um intérprete inexperiente”.
Bowen, professora da Universidade de Alberta e especialista em cuidados de saúde para as populações carentes, acredita que a linguagem seja a barreira que mais impede alguns imigrantes de se manterem saudáveis.
“Pode ser que a pessoa diga que seu problema de saúde é devido a ela ser recém-chegada ao país e não saber como as coisas funcionam, mas também pode ser porque simplesmente não sabe comunicar suas necessidades”, diz Bowen. “Quando as pessoas conseguem falar por si próprias sobre o que sentem, passamos a ter uma base para começar a lidar com as outras questões”.
Pesquisas do Statistics Canada mostram que a maioria dos imigrantes chegam no Canadá falando inglês ou francês, e os dados do Censo dizem que 98% dos canadenses falam uma das línguas oficiais, mas não está claro exatamente o quão bem essas línguas estão sendo faladas ou compreendidas.
Para abordar a questão de outra forma, a Pesquisa Longitudinal do Statistics Canada sobre Imigrantes no Canadá está acompanhando 12.000 pessoas, que chegaram em 2000 e 2001, e pergunta-lhes sobre a sua saúde. Depois de quatro anos no Canadá, o percentual de homens com proficiência limitada em inglês ou francês que dizem que estavam em más condições de saúde saltou de 5% para 12%, e para as mulheres, o salto foi de 8% para 21%. O aumento foi significativamente menor entre aqueles com boa proficiência na língua.
A pesquisa mostra que os profissionais que não conseguem se comunicar com seus pacientes tendem a ser excessivamente cautelosos, fazem muitos testes e mentêm as pessoas por mais tempo no hospital. Os pacientes que enfrentam a barreira da língua tendem a usar a sala de emergência, em vez de uma clínica de cuidados primários, e procuram tratamento muito mais tarde do que deveriam.
A Rede de Interpretação em Saúde, uma agência de Ontário, criou padrões nacionais para a comunicação entre pacientes e profissionais da área da saúde, mas esses padrões não têm peso legal e muitas autoridades de saúde traçam seus próprios caminhos. Muitas vezes, os familiares tornam-se intérpretes, independentemente da falta de confidencialidade e potencial conflito de interesse. Crianças pequenas são colocadas em situações extremamente estressantes, diz Bowen, citando um caso de Manitoba, onde os médicos dependiam de um menino de oito anos de idade para interpretar a comunicação com sua mãe após o parto de gêmeos natimortos. Eles só pararam quando o menino desabou em prantos.
Os hospitais também correm o risco de quebrar a confidencialidade quando eles pedem ajuda ao vizinho que por acaso está sentado à beira do leito, ou chamam um membro da equipe que por acaso fala a mesma língua, diz Bowen.
Ray e seus colegas desenvolveram uma ferramenta de tradução para os profissionais, uma espécie de cartilha para usar quando o paciente não fala inglês e não há outras opções. É uma lista de quatro páginas de palavras comumente usadas em exames médicos – desde “abrir os olhos” até “fezes pretas” – foneticamente traduzido nas 15 línguas mais faladas em Ontário, e Ray o publicou no site stmichaels.com.
Muitos hospitais no Canadá usam linhas telefônicas de interpretação, que criam uma conversa de três vias entre o médico, o paciente e o intérprete. Embora possa ser muito eficaz, o custo por minuto de utilizar as linhas de telefone pode ser elevado, e a qualidade da tradução é muito variada.
Mas o padrão ideal continua sendo os intérpretes fluentes que foram treinados na ética de interpretação e entendem tanto o ambiente médico quanto as necessidades do paciente. Bowen desenvolveu um programa de interpretação da linguagem para a Autoridade de Saúde Regional de Winnipeg, colocando a responsabilidade pelos serviços de interpretação para uma variedade de agências nas mãos de um coordenador central. Os intérpretes são selecionados, treinados e pagos pela autoridade de saúde, que determina o uso dos intérpretes em determinadas situações. Em Ottawa, há a opção de contratar intérpretes de várias agências locais.
“Intérpretes de saúde treinados permitem que os pacientes falem por si”, diz Bowen. “É uma comunicação bidirecional que permite que os pacientes façam parte de todo o processo relacionado ao seu problema de saúde”.
Durante seu tempo em Winnipeg, Bowen percebeu que não são apenas os novos imigrantes que enfrentam a barreira da língua. Muitos enfermeiros que trabalham com imigrantes idosos vindos de lugares como Alemanha e Ucrânia disseram a ela que estavam tendo dificuldades para se comunicarem com seus pacientes, que estão perdendo suas habilidades em inglês com a idade.
“Um dos grandes desafios é que as pessoas não veem o quanto estamos pagando por não lidarmos com essa questão”, diz Bowen. “Pagar para os intérpretes é um custo visível, é uma questão de orçamento. O que eles não veem são os custos ocultos dos médicos pedindo muitos testes, ou os pacientes desenvolvendo complicações e tendo que ficar mais tempo no hospital, ou organizações assumindo uma responsabilidade legal por não estarem protegendo a confidencialidade dos pacientes”.
Louisa Taylor The Ottawa Citizen