Siga-nos

OiCanadá

Cultura

É legal ser ilegal?

O sonho de morar fora do Brasil e viver em um lugar com melhores condições tem levado milhares de brasileiros a permanecerem ilegalmente em vários países ao redor do mundo. Viver clandestinamente implica em inúmeras dificuldades, mas os que optam por esta condição têm, em geral, um objetivo: fazer um “pé-de-meia”. E Toronto possui um segredo impossível de se guardar: é a cidade que mais abriga ilegais no país.

Não existem estatísticas precisas, pois por razões óbvias se trata de uma questão obscura. Segundo dados do Consulado Brasileiro em Toronto, vivem hoje no Canadá mais de 15 mil brasileiros, não se podendo ainda mensurar o número de ilegais. O que se publica na mídia diariamente é que leis mais duras estão sendo aplicadas e que o cerco está fechando. Mas a realidade que se presencia por aqui é outra.

Com a sua grande maioria situada na região West de Toronto, os ilegais saem dos chamados “guetos” e se misturam dentre os demais, levando uma vida aparentemente normal e tranquila. Eles têm carro, carteira de motorista, casa própria, cartão de crédito, conta no banco e etc, e acreditam que vale a pena pagar um alto preço e correr o iminente risco da deportação. Com opções de trabalho limitadas, a grande maioria dos brasileiros ilegais vivendo em Toronto trabalha na construção civil ou fazendo faxina. É normal vir como estudante e acabar “ficando”, ou simplesmente entrar com o visto de turista já munido de “segundas intenções” para, quem sabe um dia, voltar ao Brasil com a tão sonhada estabilidade financeira.

Há  os que acreditam que as autoridades fazem “vista grossa”, pois o país precisa da mão-de-obra barata, como é o caso do nordestino A.B.F., em Toronto há 4 anos. Ele diz que veio “fazer dinheiro”  e tem o perfil típico do imigrante ilegal brasileiro: mantém o low profile (vive discretamente), trabalha no ramo da construção civil, manda dinheiro regularmente para o Brasil e sente muita saudade de casa. Engenheiro Civil no Brasil, A.B.F. é um jovem de 27 com poucas palavras, viu aqui a possibilidade de ganhar dinheiro aliado ao fato de não ter que pagar imposto. Com um salário de C$25 por hora de trabalho, ele diz que “o Canadá me deixou ficar. Sem a gente (ilegais), o país quebra”, diz com ar resignado.

Pra os homens existe a construção civil, para as mulheres, a limpeza. K.M., de 25 anos, veio de Minas Gerais há dois. Formada em Administração Hospitalar, não encontrou boas alternativas de emprego no Brasil e como tinha uma amiga morando em Toronto, seguiu o exemplo e veio “tentar a vida”. Hoje ela é cleaner (faxineira) trabalhando em um prédio comercial, no centro da cidade e divide um basement (piso abaixo de uma residência) na Rogers Street & Oakwood com o atual namorado, que também é ilegal. “Muitas vezes me pergunto o que ainda estou fazendo aqui. Acho que “fui ficando” e não me vejo voltando para o Brasil ainda. Dá pra juntar uma grana, mas não vejo futuro. Temos que traçar objetivos e penso na minha aposentadoria”, diz ela e completa. “Não sei se preencho requisitos para imigrar, acredito que meu futuro seja mesmo no Brasil, não me vejo sendo um fantasma pra sempre”, acrescenta. Um cleaner ilegal em Toronto ganha em média $10 por hora de trabalho, isento de imposto.

O cotidiano dos clandestinos é árduo. Trabalho pesado sem amparo de leis trabalhistas, aliado ao frio cortante, certas privações e ainda a saudade dos que ficaram no Brasil. Outros empregos comuns são em fábricas, lava-jatos, garçonete em bares brasileiros ou portugueses, ou landscape (jardinagem). Se for pego pelas autoridades locais, o clandestino é preso e aqui permanece até ser deportado ao Brasil. Antes disso, passa por um processo judicial até que o governo local compre sua passagem de volta. Muitas vezes, o deportado não pode mais entrar no país do qual foi expulso.

Regina Moura, gerente geral da “Total Help”, empresa que presta assessoria imigratória, jurídica e empresarial em Toronto, diz que mensalmente recebe mais de 30 pedidos de ajuda em processos de imigração. “Sei o quanto é difícil estar ilegal nesse país. O ideal seria que todos buscassem uma maneira de se legalizar, pois cedo ou tarde, o governo vai atrás e daí você já perdeu muitos anos de sua vida”, diz.

Será  que vale pagar um preço tão alto e viver no ostracismo, de forma invisível? Será que vale a pena viver em um eterno “jeitinho brasileiro” e fazer parte de um problema social? Regina Moura complementa e aconselha: “aprendam o inglês, estudem, ampliem os horizontes e no futuro vocês poderão ser o que quiserem. Ficar apenas trabalhando na limpeza ou construção, dia após dia, sem aprender inglês, só ganhando dinheiro, pode não parecer, mas é perda de tempo”, finaliza.

Continue lendo
Publicidade
Leia também...

Formada em jornalismo pela Universidade Potiguar, Amanda iniciou sua carreira no ano de 2000 em Natal, Rio Grande do Norte. Sempre cercada de livros, o gosto pela escrita, leitura e a vontade de ser jornalista vieram desde muito cedo, tão cedo que nem se lembra mais. O começo da carreira foi marcado pela atuação na área de assessoria de imprensa, com foco na comunicação organizacional, passando pela redação de um dos jornais mais importantes da cidade, até a decisão de vir pra Toronto, onde reside e atua como jornalista desde 2007. Além do jornalismo, carrega em si a paixão por livros, música, televisão, cinema e fotografia. Escrevendo para jornais atuantes na comunidade brasileira, ela agora escreve também para o OiCanadá. Curiosa, antenada e munida de um intenso desejo de aprender, para ela, conhecimento demais, ainda não é suficiente.

65 Comentários

65 Comments

                        Deixe uma resposta

                        O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

                        Mais em: Cultura

                        Topo