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Experiência

Se Toronto fosse uma pessoa…

Eliana Rigol conta que precisa de pessoas ao seu redor para ser feliz, descreve como seria Toronto se a cidade fosse uma pessoa, e ainda fala das dificuldades de morar em uma terra nova.

Pessoas, pessoas e mais pessoas. Quantidade de gente ao seu entorno não é qualidade de companhia, mas te garante uma boa dose de humanidade. Além do que, só crescemos no embate, no relacionamento, seja com quem seja. Assim como as personagens das histórias só mostram quem são em um diálogo ou ação e não com aquilo que dizem ser, nós também somos o que comunicamos ao mundo, somos como reagimos com as pessoas.

Aqui no Canadá, a falta de amigos é sempre pauta para os que vêm de fora. Quinta passada conhecemos um casal de suíços recém-chegados, carentes de gente. Eles brincaram tentando imaginar o que não deveria ser a nossa dificuldade com tanto distanciamento, logo nós: latino-americanos-ultra-afetivos, pessoas que abraçam, tocam.

Olha, até tentei explicar que viemos de São Paulo e digamos que casa cheia de amigos e entra e sai de pessoas à la vontê, não é lá muito comum. No más, pra quem deixa uma vida mais sociável em seu país, numa cidade menor, pode considerar Toronto gélida e desprovida de contato humano. Não é o caso. Adoro o modo como as pessoas dão bom dia, oferecem ajuda caso te percebam perdido e pedem desculpas se te atropelam no metrô.

Se Toronto fosse uma pessoa, pra mim ela seria alguém um pouco descolado e um pouco careta; alguém que tenta ser afetivo, mas sofre retaliações; alguém muito educado e gentil, atento às necessidades alheias, aquele tipo de pessoa que convida gente de tudo quanto é pêlo pra festa e quer ver todo mundo se dando bem.

Buenas, voltando ao tema, a questão maior não é nossa vizinha canadense que ignora cumprimentos ou sorrisos, o caso consiste em ver todo mundo sem muita esperança em fazer amigos próximos. E pra ser honesta não acho que isso seja característica só daqui não, qualquer grande cidade sofre do mesmo sintoma, exceto para quem nasceu nela e cultivou amigos ao longo da vida. Ainda assim…Vamos nos aconstumando ao confinamento, reduzindo o número de pessoas na nossa convivência diária até quase esquecer como era na nossa infância, onde os amigos entravam em casa sem bater. Esquecemos o quanto é insubstituível a presença física de alguém. Isso sem falar na internet que ajuda um bocado por um lado e por outro dá a falsa sensação de fazer contato.

Fato é que semana passada me senti mais gente, tudo porque tive uma série de encontros com pessoas numa frequência acima do normal. Momento de “abertura política”. E demorei pra me dar conta de que preciso de gente, amo cozinhar pra todo mundo, juntar amigos em casa, conversar sem pressa. Tá na hora de se expor, ligar, convidar, sem se importar com o resultado. Baixando as barreiras, a gente vai conhecendo gente bem legal. No fim, percebemos que o lugar não é fechado, nós é que andamos com os dois pés bem atrás para evitar constrangimento.

Viver fora é se jogar num mato cheio de cachorros de outras raças, com latidos indecifráveis. Podemos ser mais leves, esquecer as diferenças e brincar ou se esconder e ficar só.

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Eliana Rigol é uma inquieta faceira nascida no sul do mundo. É autora do livro "Moscas no Labirinto" e cotidianamente deixa as ideias fluírem num blog que mantém há muitos anos. Advogada por formação, adotou a fotografia e a escrita como formas de tornar a vida mais leve. Migrou para Toronto em 2010, se tornou mãe da Luna, já rodou o mundo e voltou. Acredita no vento, no coração e no movimento.

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